Brasil: O País dos Juros

Brasil: O País dos Juros

A Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN) acabou de lançar um livro denominado “Como fazer os juros serem mais baixos no Brasil”. Para quem é de fora e não conhece as taxas de juros praticadas, só de ver o título feito pela própria federação dos bancos sabe que tem algo errado por aqui. E quem acaba pagando por isso é a população.

Juros

Antes de mais nada, vale a pena recapitularmos qual é o conceito por trás dos Juros. Todas as vezes que uma instituição financeira, ou até, em boa parte dos casos, alguma pessoa empresta dinheiro para outra, quem empresta está abrindo mão do uso deste dinheiro, e, ainda está disposto a correr um risco de não receber o mesmo de volta (risco de crédito). Por conta desses dois fatores, podemos dizer que como remuneração de quem emprestou, quem tomou o empréstimo acaba tendo a obrigação de pagar uma espécie de “aluguel” pelo dinheiro do outro. Esse aluguel, conceitualmente falando, é representado justamente pelos juros. A formalização disso acaba formando o sistema de crédito.

Esse sistema funciona desde os primórdios. Documentos históricos mostram que a civilização suméria, desde 3.000 a.C, tinha um sistema de crédito baseado no grão e na prata.

Taxa Básica de Juros e CDI

No atual sistema financeiro, os países criaram suas taxas básicas de juros, que representam à remuneração que o tesouro nacional paga a seus credores (dinheiro que o governo pega emprestado). Essa taxa acaba funcionando como taxa de referência para todos os contratos de crédito da economia do país. Essas taxas são dinâmicas e acabam entrando na pauta da política monetária de cada país. Hoje, o Brasil está com sua taxa básica de juros (chamada taxa Selic) no menor valor da história, com 6,5% ao ano. Isso se dá pelas medidas econômicas tomadas para o país enfrentar a recessão econômica.

Como comparação, há países em que a taxa básica está negativa, como é o caso da Suíça e do Japão. Por outro lado, há países que estão com taxas elevadíssimas, como é o caso da Argentina, que pela crise econômica em que vive, está com taxa na casa dos 54,89% ao ano.

Essas variações são reflexos, justamente, das políticas monetárias. A taxa básica de juros acaba sendo um dos principais instrumentos que os governos possuem para controlar a inflação do país. De maneira geral, o governo analisa o nível de atividade econômica, e modifica a taxa de juros de acordo com isso. Quando a economia estiver muito aquecida e o nível de desemprego estiver baixo, pode haver descontrole inflacionário (aumento elevado dos preços). Com isso, aumenta-se a taxa Selic, aumentando, consequentemente o custo do crédito, diminuindo a circulação de dinheiro. No caso oposto, cenários de crise, diminui-se a taxa Selic para baratear o crédito, incentivando o aumento do consumo.

Além da Taxa Selic, outra taxa referencial importante são os Certificados de Depósitos Interbancários (CDI). Tratam-se de títulos emitidos pelos bancos como forma de capitalização ou aplicação de recursos excedentes. Ou seja, ela acaba sendo a taxa de juros aplicada nas operações realizadas entre os bancos, e, que acaba sendo também utilizada como referência nas remunerações de diversos investimentos oferecidos pelos bancos. Ela acaba andando lado a lado com a Selic, tendo valores muitos próximos.

Porém, conforme foi dito, mesmo com a redução da taxa Selic para o menor valor da história, os juros ainda apresentam-se bem elevados. Isso mostra que existem outros motivos que contribuem para isso.

O papel do banco

Conforme foi dito, o crédito é algo que já existe há muito tempo na história da humanidade, porém, com o passar dos anos ele precisou ser aperfeiçoado. O risco do crédito trouxe o surgimento dos intermediadores, como bancos, financeiras e cooperativas. Basicamente estas instituições ligam os dois lados: o investidor e quem está buscando o empréstimo. Mais do que ligar, toda a operação acaba sendo de responsabilidade da instituição financeira, inclusive o risco de crédito, e, justamente por isso, há um serviço que será cobrado nesse meio termo. Esse serviço acaba sendo representado pelo spread, que é a diferença entre o preço de compra e o preço de oferta da transição monetária. Para ilustrar, vejamos um exemplo:

Investidor: aplicação de R$ 10.000, com taxa de rentabilidade de 1% a.a

Tomador: recebimento de R$ 10.000, com taxa de juros de 8% a.a

Repare que há uma diferença de 7% do juros que o tomador paga e da rentabilidade que o investidor recebe. Essa diferença é justamente o spread, que a instituição recebe pela prestação do serviço.

Dentro da composição do spred acabam entrando os seguintes itens (percentuais de acordo com levantamento do Banco Central): custos administrativos (0,75%), depósito compulsório e encargos(2,61%), inadimplência (39,95%), impostos (22,68%) e lucro (34,02%). De acordo com o Banco Mundial, o Brasil tem um dos spreads bancários mais altos do mundo.

Os números mostram que o fator inadimplência tem um peso muito grande no país. Enquanto a inadimplência é alta, alguém tem que pagar a conta, logo, os que pagam em dia acaba tendo que arcar com as consequências de quem atrasa. Esta inadimplência pode ser entendida como alta justamente pelo baixo nível de educação financeira da população e pelos juros elevados, que impossibilitam que muita gente consiga pagar suas obrigações. O Brasil está tentando aperfeiçoar seu cadastro positivo e score, porém, ainda há muita coisa a ser feita. A questão tributária também tem um grande peso nessa conta, novamente, uma das maiores do mundo, que acaba sendo repassada ao tomador do crédito. Os próprios custos administrativos, que representam uma menor parcela, acabam sendo bem mais elevados do que na maioria dos países. No livro da FEBRABAN, é mostrado que numa amostra de 12 países, o Brasil é o segundo com maior custo operacional.

Apesar do livro da FEBRABAN trazer que a concentração bancária não é motivo para juros tão altos, trata-se de um ponto que precisa ser desenvolvido. A concorrência é fundamental para todos os segmentos, pois trás melhor qualidade aos serviços e produtos e preços mais justos ao consumidor. De acordo com o Banco Central, os cinco maiores bancos brasileiros respondem por 82% de todo o mercado financeiro do país, uma das maiores taxas de concentração do mundo.

Categorias

Existem diversas categorias de crédito disponíveis, tanto para Pessoa Física quanto para Pessoa Jurídica. De maneira geral, categorias como cheque especial, juros do cartão de crédito, empréstimo pessoal e capital de giro, são as categorias mais caras, pois representam maior risco para o banco. Já os financiamentos, desconto de duplicatas e o consignado acabam sendo formas mais baratas de crédito, porque acabam tendo uma garantia por trás, e isso diminui o risco para o banco. Basicamente, o banco acaba utilizando a relação Risco x Retorno para determinar os juros que serão cobrados.

Porém, mesmo com as garantias, no Brasil a recuperação de garantias é mais difícil e leva mais tempo do que na maior parte do mundo. Isso “contribui” para aumento na taxa de juros quando comparada a outros países.

O que fazer?

Para enfrentar esses juros elevados, a boa Educação Financeira é fundamental para que a saúde financeira do indivíduo seja preservada. Evitar gastar mais do que se tem, comparar categorias de crédito em diferentes instituições (não se esquecendo de cooperativas de crédito e Fintechs), evitando juros do cheque especial e cartão de crédito, e um bom controle e planejamento das finanças são exercícios imprescindíveis.

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